segunda-feira, 26 de outubro de 2009

OS BEATLES VISTOS POR OUTRO PRISMA


Este meu trabalho não pretende ser mais umas quantas linhas debruçadas sobre um dos mais discutidos conjuntos da actualidade. Muito se tem escrito (e falado), mas não quero ser mais que "gosta" de escrever sobre os Beatles.

Os outros (talvez com fins meramente comerciais) só escrevem sobre os Beatles-guedelhudos, os Beatles-hipócritas, os Beatles-símbolos da decadência da juventude. Mas não é sobre isso que me vou debruçar.

Em duas partes dividirei estas minhas considerações: a primeira recairá sobre os Beatles-humanos e a segunda, sobre os "tais" Beatles-guedelhudos, etc.

Pedi ao tempo que voltasse para trás, à adolescência de cada um dos Beatles.

Quando John Lennon apenas contava 14 anos viu morrer sua mãe, vítima de um acidente de viação, e aos 16, o seu pai abandonou-o. Tudo isto pode influir, e com certeza que influiu, no espírito deste jovem, que assim se viu obrigado a viver 10 anos com a sua tia Mimi, de quem, aliás, não gostava verdadeiramente. Podia aqui ter nascido um criminoso, um revoltado; mas não, nasceu um Beatle, que, aliás, para muita gente é símbolo de criminoso, de revoltado.

Paul McCartney, quando ainda estava nos seus "teens", ficou sem mãe; o pai voltou a casar, e não será necessário focar aqui as proverbiais aversões entre madrastas e enteados. Portanto, mais uma adolescência infeliz, perigosa, de futuro sombrio.

Felizmente que ocorrências como estas não as apontamos para Ringo Starr e George Harrison.

Em 1960, ainda os Beatles se denominavam Silver Beatles, fazia parte do grupo Stu Sutcliff, um dos amigos mais íntimos de John, um quase-irmão. Numa das viagens dos Silver Beatle à Alemanha, Stu enamorou-se de uma rapariga alemã, Astrid Kirchherr, e separou-se dos seus amigos.

Quando da terceira viagem a Hamburgo, Astrid, de lágrimas nos olhos, esperava-os no aeroporto. A notícia caiu como uma bomba. John não tinha irmãos nem irmãs; a sua mãe tinha morrido; o pai tinha-o abandonado, por isso a notícia da morte de Stu foi um terrível golpe para John.

Pois ainda hoje, decorridos já seis anos, os Beatles, religiosamente, vão depôr flores no túmulo de Stu. E este acto de verdadeira amizade é feita sem intuitos publicitários. É apenas uma homenagem que fazem não como ídolos, mas sim como Homens. Além disto, no aniversário da sua morte, pedem às estações emissoras inglesas que não transmitam interpretações por si realizadas.

Não faço comentários que julgo desnecessários.

Os cabelos dos Beatles são compridos, admito-o. Mas serão assim tanto como o apregoam? Não vou compará-los aos de Mozart, aos de Napoleão porque, além do mais, são de épocas diferentes. Mas comparo-os aos jovens de agora, aos artistas do tempo dos Beatles. Não terão os Rolling Stones, PJ Proby, Byrds, Pretty Things cabelos mais compridos e, vamos lá, sem exagero, mais nojentos?

Podem atirar o "slogan" já bastante estafado: "é moda" e "foram os Beatles que a lançaram". Então não há personalidade? Usa-se determinada coisa só porque é moda? Não está certo!

Os Beatles causadores da decadência da juventude... Porquê? Por causarem gritinhos histéricos, desmaios e toda uma série de burburinho nos espectadores e nas casas de espectáculo? Mas isso já acontecia nos anos 40 ou mesmo antes, quando dos tempos gloriosos do jazz.

Os jornais não poderão ter a sua parte na culpa?

Imagine-se que até os jornais portugueses apregoam com títulos sensacionalistas como "novo recorde dos Beatles: 131 raparigas hospitalizadas" ou "mais de 100 ambulâncias utilizadas após um espectáculo dos Beatles", os devaneios de crianças sem tino.

Quais os motivos destes devaneios? Uma maneira nova de exprimir sentimentos ou incitação dos próprios Beatles? Parece-me mais lógica a primeira hipótese, pois os Famosos Quatro nada fazem no palco de molde a incutir tantos distúrbios nos espectadores, excepto bater o pé ao compasso do ritmo, como toda a gente.

Sim, então será uma nova maneira de exprimir sentimentos, bastante exagerada, também concordo, mas...

Anónimo de 18 anos, "O Arauto", jornal do Externato Clenardo (Lisboa), Março/Abril de 1966.

10 comentários:

Rato disse...

Muito curioso este artigo.
As coisas que este blog vai desencantar...

josé disse...

O autor do artigo, anónimo, já era notoriamente, uma conhecedor dos Beatles, nessa altura.

Só me pergunto como é que conhecia estas realidades descritas que hoje ainda poucos conhecem.

Rato disse...

Não me admira nada, José. Em 1966 a Beatlemania estava no auge e os fans sabiam tudo e mais alguma coisa. Em Moçambique não havia televisão (também para o caso seria igual ao litro) mas todas as semanas a miudagem (onde eu me incluía, é claro) comprava avidamente os jornais musicais ingleses que lá chegavam via África do Sul.

Muleta disse...

eu cá conheço bem este anónimo!!!!
poucos anos depois também escrevi para este jornal uma crónica sobre os blood, sweat and tears e julgo que sobre o simon and garfunkel.
nenhuma delas sem o brilhantismo desta sobre os beatles.
é engraçado como no arauto "nasceram" pelo menos tres jornalistas. o terceiro é o fernando ricardo, reporter fotografico da extinta capital.
para este jornalzinho de colégio foi o unico a conseguir uma foto do concerto da sylvie vartan (ou outra, nao me recordo), o que nenhum reporter fotografico conseguiu!!!!!!

Muleta disse...

eu cá conheço bem este anónimo!!!!
poucos anos depois também escrevi para este jornal uma crónica sobre os blood, sweat and tears e julgo que sobre o simon and garfunkel.
nenhuma delas sem o brilhantismo desta sobre os beatles.
é engraçado como no arauto "nasceram" pelo menos tres jornalistas. o terceiro é o fernando ricardo, reporter fotografico da extinta capital.
para este jornalzinho de colégio foi o unico a conseguir uma foto do concerto da sylvie vartan (ou outra, nao me recordo), o que nenhum reporter fotografico conseguiu!!!!!!

Anónimo disse...

Então o anónimo não é o LT ?

Anónimo disse...

Trancrição de post anterior:

Este foi o meu primeiro texto sobre os Beatles, uma polémica (acesa) com
o director do Externato Clenardo, de Lisboa, o feroz padre Jorge Lereno (dizem-me que ainda é vivo). Corria o ano de 1966.


http://guedelhudos.blogspot.com/2008/02/o-primeiro-texto-sobre-os-beatles.html

Anónimo disse...

Transcrição :)

josé disse...

Os padres sempre foram conservadores de costumes.

Até aos 13 anos dei conta disso e deixei-me influenciar de certo modo. Não ligava aos Beatles e outros, como os Stones por causa disso. Depois, dei o grito de ipiranga nessa mentalidade e passei a gostar de ouvir o que era agradável ao ouvido, a música popular.

Outro assunto em que eram conservadores era em matéria mais delicada, sobre saias. Censura total.
Por isso mesmo, fiquei a gostar ainda mais...

josé disse...

O fruto proibido é sempre o mais desejado, lá diziam os antigos. E censurar costumes é a forma mais rápida de os tornar mais apelativos.
Foi isso que sucedeu com os cabelos "à Beatle", como é referido no texto, bem exemplar do que se passava por cá, em 1966.

Mas também a mini-saia era tema de controvérsia...